Primeiras Estórias - João Guimarães Rosa

 



Agora entendo a paixão que Guimarães provoca em seus leitores, quase sempre em disputa acirrada contra os apaixonados por Machado (meu caso).

Mas se a disputa é para estabelecer, afinal, qual seria nosso maior escritor, eu já agora acredito inútil tal juízo: ganha a literatura brasileira se soubermos ler os dois, e ganhamos nós em tê-los como os (dois) maiores gênios de nossas letras.

Quem não conhece ainda Guimarães, este Primeiras Estórias serve de excelente acesso ao mundo do autor de Grande Sertão: Veredas.

Porque a gente só se encontra com um escritor após dançar um pouco no seu ritmo. E o ritmo de Rosa, sua criação frásica se torna menos árida se a compreendemos pela intenção de contar a história sob a perspectiva da simultaneidade dos aspectos objetivos e subjetivos de seu acontecer. Rosa subverte a lógica sucessiva, as vírgulas ganham nova função de enquadre, de enfoque, a língua do sertão e seu anedotário surpreendem aquele que busca o mesmo. É surpreendente ver como Guimarães subverte a ânsia citadina pela ordenação racional.

A perda da lógica é mesmo o conteúdo e a forma do conto Darandina, o melhor do livro em termos da música própria a Guimarães. A quem deseje ir aos poucos, sugiro iniciar a leitura pelo conto O espelho, espécie de conto-tratado que preserva a lógica narrativa a que estamos acostumados. Depois, vale a pena se aventurar com:

📖 Famigerado: aguda observação sobre o efeito das palavras em quem as ignora.

📖 A terceira margem do rio: emocionante alegoria de uma despedida.

📖 Benfazeja: o amor é a única coisa pelo que vale morrer, mostrará Mula-Marmela depois de matar o marido.

📖 Partida do audaz navegante: quase um conto sobre minha Laura, emocionante!

Em suma, um livro para ser apreciado devagar, remoendo, balançando ao som das palavras do sertão, mas também da nossa vida tecnológica, cada vez mais simultânea, com a qual a escrita de Rosa guarda significativa familiaridade.

Recomendo a edição excelente da Global Editora, com posfácio de Luis Costa Lima.

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