Tardes com Platão, 3ª etapa - Leitura do Lísis de Platão

 Projeto de leitura coletiva dos Diálogos de Platão, vinculado ao Grupo de Pesquisa: Diálogo: Discurso e Ação Humana (Unifap, 2019) e coordenado pelo Prof. Dr. Cesar A. Mathias de Alencar (Unifap).


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3ª Etapa: Lísis


Edição recomendada para compra: Editora UFPA

Download do texto para a leitura: Lísis

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Memorial dos encontros

  • [14.09] Introdução à leitura do diálogo
203a-204b

A perspectiva de realização do nosso projeto de leitura Tardes com Platão. A leitura literária dos diálogos. A atividade erótico-pedagógica da filosofia a partir das 3 etapas de leitura do grupo. Sócrates e a escrita em Platão. Início da leitura do texto do Lísis. Sócrates, em movimento, é convidado por Hipótales a ficar e conversar com jovens belos na Palestra. O filósofo, resistente, procura com questões entender o valor daquele convite. Com a notícia de que Minos, homem de valor, é o professor ali, Sócrates prenuncia a existência de boas almas dispostas à sua educação filosófica. Para tanto, faz uma última pergunta: quem é o mais belo?



  • [21.09] Sócrates e o saber sobre o amor
204a-205a

Ao questionamento de Sócrates, Hipótales enrubesce. Sua vergonha, saberemos, não diz respeito ao tema do amor, mas a quem o pergunta. Afinal, o próprio Sócrates nos afirma, mais uma vez, que seu único saber é sobre as coisas de Eros. É por ele que Sócrates pode conhecer. Ctesipo toma a palavra para apresentar seu espanto em ver um Hipótales envergonhado, este que sempre, o quanto pode, diz em todo tipo de forma literária os seus delírios pelo jovem Lísis. Sócrates parece não reconhecê-lo pelo nome; Ctesipo afirma que certamente ele o reconhecerá se o vir. O reconhecimento gera em Sócrates um elogio a Hipótales, pela escolha do amado. Agora, o filósofo quer saber o que de fato Hipótales tem dito a Lísis, para lhe conhecer a partir do que deve ser o intercurso amante-amado. Ctesipo desconfia que ele possa dizer algo com senso, por estar enlouquecido de paixão. Para Sócrates, a paixão será o que de mais próprio sustenta uma opinião, e o conhecer.



  • [28.09] Sobre o que não se deve falar a quem se ama
205b-206c

O anseio de Sócrates é, afinal, saber qual o pensamento (dianoia) de Hipótales. É Ctesipo quem dirá em seu lugar, mostrando-o deveras infantil por pretender lidar com Lísis como as velhas que contam histórias para crianças. O rídiculo da condição de Hipótales o põe diametralmente oposto a Sócrates, que se expõe como um sophós em matéria de amor. Trata-se de saber usar a inteligência (noûs) para ser capaz de se aproximar daqueles a quem se espera educar. Segundo essa sabedoria, não se pode louvar o amado antes de conquistá-lo, sob pena de parecer ridículo porque inferior, bem como de tornar ainda mais selvagem a presa da caça. A poesia deve predispor à educação, e Hipótales, convencido da sua desrazão (alogía) ao compor seus versos, põe-se ele mesmo, agora, disposto a aprender de Sócrates como agir e o que se deve falar para se tornar próximo e querido (prosphiles) de quem se ama.



  • [05.10] A performance socrática da aproximação
206c-207c

Ao pedido de Hipótales, Sócrates expõe sua dificuldade em dizer aquilo que só pode ser mostrado, ou seja, sua capacidade para dialogar (dialegesthai). Hipótales sugere uma artimanha cênica para atrair Lísis, que Sócrates aceita. Ao se aproximarem dos mais jovens, recém saídos de rituais do festival ao deus Hermes e a brincar jogos de decisão, Lísis se destaca como espectador, pela coroa em sua cabeça. Ao avistar o grupo dos mais velhos, sente-se atraído por se dirigir até lá, mas se encontra incapaz de decidir. Menexeno, seu amigo, prontamente se dirige ao grupo dos mais velhos, no que Lísis o segue e se põe a seu lado. Ficamos, de certo modo, conhecendo a personalidade distinta de cada um desses amigos que Sócrates irá interrogar. Sócrates os questiona quem seria o mais velho, ao que Menexeno responde ainda discordarem sobre isso, como também sobre quem é o mais nobre e mais belo. Ambos riem com a última questão de Sócrates, denunciando o tom de brincadeira da discordância. Sócrates põe-se, então, a entender aquilo que lhe confere concordância: a amizade, porque entre amigos tudo é comum.



  • [19.10] Lísis e a questão da liberdade e da felicidade no saber
206c-210d

Com a saída de cena de Menexeno, Sócrates dirige-se diretamente a Lísis a fim de estabelecer um tipo de aproximação adequada ao filósofo no intuito de atrair para educar. A questão é posta sobre o sentimento dos pais de Lísis, ditos extremamente amorosos ao filho, articulado com dois princípios: o de que quem ama espera ver o outro feliz, e o de que ver feliz é permitir que o outro faça o que quer livremente. Com uma série de indagações, Lísis é convencido a pensar que seus pais lhe têm em mais baixa estima que a seus escravos, contra o que o jovem afirma tratar-se de sua falta de saber (episteme) sobre os assuntos de que é privado em agir pelos pais. Apreciando a resposta de Lísis, Sócrates introduz uma nova consideração, sobre a utilidade (o quanto podemos usufruir do saber-fazer que outro possui) daquele que sabe como determinante da aproximação amorosa pela philía.



  • [26.10] O resultado da aproximação socrática: o erotismo pedagógico
210e-211c

Reconhecida sua condição de aprendiz, Sócrates volta-se para Hipótales, desejoso de lhe dizer o quanto sua forma de se aproximar estava certa, e errada a de Hipótales. Mas se contém, por lembrar que não desejava ser visto por Lísis. Nesse momento, Menexêno retorna, e Lísis pede a Sócrates que conte o que eles dialogaram. A relação entre Sócrates e Lísis, estabelecida na ausência de Menexêno, é agora a peça central da posição que Sócrates é convidado a assumir diante do amigo de Lísis, a fim de com ele disputar. A ironia da caracterização de Menexêno como um erístico terrível é parte desse jogo que o oporá aos dois eróticos, Sócrates e Lísis.



  • [02.11] A colocação do problema da amizade: quem é amigo de quem?
211d-213a

Ctesipo, mencionado por Sócrates como mestre de Menexeno, procura saber sobre o que os três estão a conversar, e Sócrates se refere a algo que Lísis não havia entendido e pede que se interrogue Menexeno. Sócrates o faz contando possuir desde criança uma paixão por estabelecer amizades, de modo que a dos dois jovens ali presentes aparece uma maravilha, sobretudo porque é raro haver reciprocidade. Nesse ponto, Sócrates questiona Menexeno, posto ironicamente como um perito no assunto, sobre como se deve usar o predicado "amigo de": de início, parece ser apropriado nos casos, semelhante ao erótico, em que se aplica a quem ama/tem afeição; depois, parecer apropriado indicar apenas quando é recíproco; e por fim, inserindo os casos em que se pode ter afeição por objetos, Sócrates indica a conclusão de ser mais apropriado chamar amigo aquele que recebe a afeição, não importando se este também lhe tiver afeição ou então odiá-lo, ao que Menexeno acaba por concordar com tais modificações da ideia principal.



  • [09.11] Sobre o que define a relação de amizade
213b-214e

Ao finalizar o absurdo no qual parece estar implicada a caracterização da amizade a partir do objeto de apreço, Sócrates induz Menexeno a voltar para a primeira tese, como resultado aparente da verdade da tese oposta. Contudo, a conclusão é que nenhuma das três teses mostraram-se adequadas para descrever o fenômeno, e diante da dificuldade do amigo, Lísis assume a palavra. Sócrates, admirado pelo interesse do jovem pela filosofia procede a partir das origens, indicando a sabedoria dos poetas e sábios ao dizerem que, nas relações, o semelhante atrai o semelhante. Na interpretação que Sócrates faz da sabedoria poética, o semelhante só pode ser aquele que não está em desacordo consigo mesmo. Ao chamar esse semelhante de bom, o filósofo indica que a amizade, e aqueles que são amigos, foram enfim descobertos: são aqueles que, sendo semelhantes a si mesmos, são bons e assim encontram seus semelhantes. Os maus, por sempre serem inconstantes, são incapazes de amizade.



  • [23.11] Os semelhantes ou os diferentes se atraem?
214e-216b

Sócrates levanta o problema de se pensar, a partir dos poetas e sábios, a ideia de que o semelhante atrai o semelhante. Considerando a utilidade que provoca a afeição (agapé) que aproxima reciprocamente, os bons, sendo autossuficientes, não são úteis uns aos outros, razão porque não se afeiçoam e não se fazem próximos a ninguém. Tal conclusão mobiliza Sócrates a considerar o que ouviu certa vez, sobre a opinião oposta: que os semelhantes são os maiores adversários dos semelhantes, de modo que a amizade se estabelece entre os dessemelhantes, porque o que tem falta deseja se aproximar do que possui aquilo que lhe falta, como o doente deseja o médico e o ignorante, o sábio. A verdade da tese é então corroborada por Menexeno que, provocado por Sócrates, não percebe o problema em questão: como a inimizade pode ser causa da amizade, e os inimigos serem amigos? A essa conclusão erística, os jovens não puderam senão dar seu assentimento.


  • [30.11] Sobre presença e ausência: o exemplo da medicina
216c-218c

Sócrates, à maneira dos adivinhos, estabelece o que se configura como um terceiro gênero de sujeitos na relação de amizade: aquele que nem é bom nem mau. Sua inspiração, profética de certo modo, traz a percepção fugidia do amigo, difícil de definir como o belo. Mas se o bom é belo, o que ressignifica a noção do bem para o âmbito da aparência, então é preciso entendê-lo como podendo estar ou não presente em algo. O exemplo da medicina retorna aqui: se o corpo, nem bom nem mau, está com saúde, que é bom, então não precisa do médico. Mas estando presente o mau, a doença, ele deseja o médico, de modo que ao final os interlocutores concordaram, de maneira uníssona, que o amigo é aquele que desejo o bom devido à presença do mau.



  • [07.12] Como entender o princípio da amizade?
218c-220e

Ainda que tenha parecido promissora a definição obtida, Sócrates pressente talvez não se tratar senão de uma ilusão. A suspeita é destacada por uma nova descrição acerca da relação, ao inserir a finalidade como parte da aproximação de amizade. Se o corpo deseja a medicina devido à (diá) doença, ele deseja a medicina em vista (héneka) da saúde. Desse modo, chega-se a ser amigo do amigo em vista do amigo por causa do inimigo. Nessa tríade, o mal aparece como um problema. Antes, a dificuldade está em saber que tipo de amigo poderia ser desejável por si mesmo, dada a sequência infinita que parece surgir. Sócrates estabelece o verdadeiro amigo como o princípio (arkhé) da amizade, desejado por si mesmo. Mas seria possível desejar o bem em vista de si mesmo e não por causa do mal? Eis a situação da ética.



  • [14.12] Ainda é possível saber o que constitui a amizade?
221a-223b

O problema da presença do mal como causa do bem levantou a possibilidade de se pensar na destruição do mal, a fim de saber se o bem prevalece. Apenas pela consideração do desejo essa possibilidade se dá, visto que o desejo não seria nem bom nem mau, o que sugere continuar existindo mesmo se o mal não existir. Desse modo, o desejo como esquema para representar a amizade impõe-se, mesmo que se pense o desejo como falta. Pois o que nos falta diz do que nos é próprio, de modo que amamos, desejamos e temos afeição com o que nos identificamos, com o que somos familiarizados. Essa conclusão última do argumento, que parecia promissor, não se mantém quando Sócrates retorna a questão do bom e mau, que havia sido posta de lado no âmbito do desejo. Mas os jovens não perceberam o esforço de Sócrates em situá-los na aporia, e ao se dizer sem palavras, para que Hipótales aparece e tome a palavra, surgem como bárbaros os pedagogos dos jovens, que põem fim a conversa. Ao final, Sócrates não deixa de indicar o ridículo de eles, considerados amigos, não poderem definir o que se fato é um amigo. Mas a cena final não seria, de algum modo, certa sugestão de resposta?




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